quarta-feira, 18 de março de 2009

Entre o céu e o mar


Conheça a modalidade que mexeu com a cabeça dos surfistas, revolucionou os esportes aquáticos e enche de cores as praias brasileiras

A emoção de juntar céu e mar. Essa aventura com sabor de liberdade é conhecida pelo nome de kitesurf, ou apenas kite. E é provocada pela simples combinação de uma pranchinha nos pés somada à força dos ventos impulsionando uma pipa presa às mãos por uma corda. O resultado: um vôo rasante na água e visual de encher os olhos. Quem já viu algo parecido provavelmente entendeu que esse é o espírito do esporte – uma mistura de surfe, windsurfe e wakeboard (esqui aquático).

Apesar de ser uma prática relativamente nova, o kite já possui adeptos no mundo todo. No Brasil, são mais de três mil praticantes. Entre eles, atletas profissionais que elevaram o esporte para além de um estilo de vida; e melhor, arrasando nos torneios. Mas num país que possui, de norte a sul, mais de sete mil quilômetros de litoral – percurso que reúne os melhores lugares para praticar o kitesurf -, soaria mesmo estranho se os brasileiros ficassem para trás.

Miller Morais, 27 anos, está ai para comprovar essa teoria. Nascido em Ilhabela, São Paulo, resolveu ser atleta profissional na área de esportes radicais. A paixão pelo kitesurf começou quando viajou para o Havaí, em 1999. Foi lá também, onde a prática já era bem mais difundida, que aprendeu novas manobras e conheceu melhor o esporte. A partir daí, passou a difundir pelo Brasil todas as suas experiências adquiridas no exterior. Segundo colocado no Mundial de Kitersurf PKRA (Professional Kiteboard Rides Asssociation), na categoria Wave, Morais diz que costuma treinar nas praias do Nordeste. “Gosto de velejar com ventos em torno dos 25 nós endas de dois a três metros, mais ou menos”.

Além dos ventos, que dão o impulso para a realização das manobras, é a pipa o principal instrumento do Kitesurf, funcionando como uma espécie de pára-quedas (é feita do mesmo material). O formato abaulado e as asas aerodinâmicas são para facilitar o vôo. Essa estrutura foi pensada por Dominique e Bruno Legaignoux, dois irmãos franceses obcecados por velejo e esportes aquáticos, ao registrar a patente da “asa curvada com estrutura inflável”. A partir daí, em 1985, o kitesurf tomou sua forma atual. A regulamentação do esporte é monitorada pela Associação Brasileira de Kitersurf (ABK). Para isso, todas as escolas de kite são monitoradas a partir de um padrão estabelecido, que consiste em uma prática segura e profissional. “A evolução dos equipamentos, para torná-los mais seguros, também, tem sido uma constante. É bom também tomar cuidado com os lugares, pois nem todos são apropriados para a prática”, comenta Miller Morais.

Apesar de o clima ser favorável o ano inteiro, cada região do Brasil apresenta os melhpores ventos em determinadas épocas. Da Bahia em direção ao Sul do país, a chegada das frentes frias favorece à pratica do kitesurf. No Nordeste, a temporada dos ventos começa a partir de junho e vai até fevereiro. No ranking das melhores praias para a pratica, Praia de Luís Correia (PI), Jericoacoara (CE), Cumbuco (CE), São Miguel do Gostoso (RN), Maracaípe (PE), Ilhabela (SP), Postinho (RJ), Araruama (RJ) e Ibiraquera (SC).

Apaixonado pelas praias cearenses, João Henrique Ferreira, 33 anos, que é kitesurfista e fotógrafo profissional, costuma dizer que o Ceará tem um clima excelente, águas na temperatura ideal e os melhores ventos para a prática do kitesurf. Tanto que se mudou para lá. “As praias do Futuro, de Paracuru, do Coqueiro e a de Cumbuco são as minhas preferidas.” Esta última já sediou, ano passado, a sexta etapa do mundial do Kite Professional World Tour (KPWT).

Além de desfrutar da sensação que o esporte lhe proporciona, João também leva a vida fotografando outros atletas, registrando cada momento de saltos, giros e quedas. “O kite é um esporte que nos passa uma energia muito boa de liberdade. Não há motor, apenas a força do vento junto com a pureza da água do mar e a beleza natural da praia.”, descreve. Em 2007, ele ficou entre os três melhores no brasileiro e foi segundo colocado do campeonato cearense. “Estou me dedicando para continuar entre os três melhores do campeonato brasileiro, senão o melhor, e conseguir outros títulos.”

O pernambucano Eduardo Fernandes, mais conhecido com “Rato”, é também um dos atletas seduzidos pelo estilo do kitesurf. Surfista Professional, assim como Miller Morais (são amigos) ele conheceu o esporte quando viajou ao Havaí, em 2000. “Alguns surfistas profissionais amigos meus começaram a fazer e me incentivaram a praticar. Acabamos nos motivando”, conta ele, que de tanto treinar, acabou conquistando o vice-campeonato da primeira etapa do brasileiro de kitewave, em 2007, e foi campeão sul-americano de hang time, em 2003.

Distante das competições, Rato divide o seu tempo entre o trabalho, a família e o kitesurf. É dono e professor de um centro de treinamento de esportes de prancha, o Boardcenter, que fica na praia de Maracaípe, Litoral Sul de Pernambuco. “Nossa escola é referência no ensino do kite no Brasil. Já formamos mais de 750 alunos”, afirma. Para os que pretendem se aventurar no esporte, ele adverte que é fundamental saber nadar e aprender a manusear corretamente os equipamentos.

Nas competições, as modalidades mais conhecidas são o Freestyle, executado com manobras similares às de wakeboard (em vez de uma pipa, a prancha é puxada por um barco em alta velocidade); a regata, que se assemelha às corridas de vela; e o kitewave, com manobras executadas nas ondas, parecido com o surfe. De acordo com Gustavo Foerster, competidor e diretor de conteúdo do site Windzen, www.windzen.com.br, (responsável pela revista Kitesurf Mania), a nova onda do momento, e a preferida dos atletas, é o kitewave. “O kitewave é uma das modalidades que mais crescem, devido a sua similaridade com o surfe, além do aperfeiçoamento dos equipamentos.” Os fabricantes até já aderiram à mistura e passaram a adaptar as verdadeiras pranchas do surf para servirem de velejo. Em setembro deste ano, Gustavo ficou em nono lugar no primeiro Sul-Americano de Kitesurf Wave. O evento contou com mais de 60 inscritos do Brasil, Argentina, Chile e Peru.

Na mira das competições

Anualmente, o circuito brasileiro, os campeonatos estaduais e as etapas do mundial fazem parte da rotina dos atletas. No time feminino, está a tetracampeã brasileira Carol Freitas. Graças ao reinado, que começou em 2002, Carol faz parte do time que representa o Brasil nos campeonatos internacionais. Com o mesmo entusiasmo, a paulista Bruna Kajiya também é um dos grandes nomes e trouxe para o país o vice-campeonato na segunda etapa do Circuito Mundial de Kitesdurf, este ano.
Favorito na categoria wave, o baiano Roberto Vieira, o Robertinho, também tem alcançado excelentes resultados. Com duas finais nas principais etapas do circuito de 2007, o Mormaii Ibiraquera Wave Contest (SC) e o oi Kitesurf, na Barra da Tijuca (RJ), garantiu o título de vice-campeão brasileiro.

Assim como a maioria, Robertinho também era surfista. Até o dia em que o vento passou a ser o seu maior aliado. “Tudo começou quando eu voltava do trabalho pela orla e vi um cara desc endo uma onda de kite meio desengonçado. Parei o carro e descobri, naquele momento, que eu poderia surfar uma onda com a ajuda do vento. Afinal, sempre que ventava, o mar ficava mexido e eu não ia surfar”, explica o primeiro praticante de kitesurf da Bahia, e hoje, um dos principais atletas do país.

Outros destaques que disputam competições ao redor do mundo são Reno Romeu (RJ), na categoria Freestyle; Wilson Veloso (PB); Guilherme Brandão (SP), o Guilly, que foi terceiro colocado no mundial de 2007; Dudu Schultz (SC); Victor Aldamo (SP); Silvio Vilarin (RN); Evandro (CE); Tomaz (CE); Goiaba (CE); e Marcelo Cunha (RJ). Como atesta Robertinho. O Brasil está muito bem representado. “Ainda não temos um campeão mundial, mas vamos ter com certeza, muito em breve”, avisa.

Matéria veiculada na Revista Viasports - outubro/novembro 2008

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