quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Vai bem aos ouvidos.


Eu ainda não tinha postado nenhuma crítica aqui neste blog. Como estou procrastinando o próximo post há algum tempo, resolvi colocar um texto que escrevi sobre o novo CD de Otto.

Assim, mato três coelhos com uma tacada só: o blog não fica velho e ainda ganha um texto de estilo diferente e pessoas não pertubam o meu juízo. :)

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Após seis anos de espera, eis que os fãs de Otto podem, finalmente, desfrutar de uma nova produção autoral. “Certa manhã acordei de sonhos intranquilos” é o nome do recém-lançado 7º álbum do artista, que também traz a essência do batuque futurista e brota dos mangues recifenses, como os anteriores. O CD foi co-produzido por Pupilo (batera da Nação Zumbi), contém dez faixas e está recheado de participações especiais, tais como Catatau (líder da banda Cidadão Instigado), Céu, na faixa “O Leite”, Julieta Venegas, nas faixas “Lágrimas Negras” e “Saudade”, além de Dengue (baixista da Nação Zumbi) e Lirinha (líder da banda Cordel do Fogo Encantado).

O último disco, “Sem Gravidade” (2003), deixando de lado a gravação do MTV Apresenta (2005), não chega nem aos pés do atual trabalho. Aos que acham que Otto tem uma péssima dicção e não canta nada, sugiro que comecem a abrir uma exceção. O ex-mangueboy, pela primeira vez, consegue abortar um material de qualidade, com música de letras poéticas e que, principalmente, fazem sentido, alinhadas a bons arranjos de cordas.

“Certa manhã acordei de sonhos intranquilos” fala de amor, não aquele obsessivo, mas algo mais simples, humano e fraterno. A fraternidade, por exemplo, aparece na música brega “Naquela mesa”, regravação de Sérgio Bittencourt. Com a base constituída por um som cafona de teclado, a letra narra as lembranças do filho sobre um pai ausente. No estilo de cantar, Otto traz à memória artistas como Benito di Paula, Luiz Ayrão e Agepê. Um brega de luxo, como os de antigamente.

Os batuques de origem manguebeat aparecem com intensidade em “Janaína”, uma letra em devoção à Iemanjá. A faixa “Meu mundo”, com participação de Lirinha, também possui batidas eletrônicas típicas da ex-banda Chico Science e Nação Zumbi.

Mas é depois de "Lágrimas Negras" que a composição musical começa a complicar. É o caso da música "Agora sim", onde ouvimos "Agora sim o saci, agora são dois irmão, agora posso correr, agora preste atenção". Será uma ode ao saci pererê? Bom, fica a questão. Já a desafinada acontece em “Filha”, quando o cantor parece não ter encontrado a nota adequada para a sua voz.

Considerando que o álbum foi gravado em um esquema de independência, sem a mão de uma gravadora e em conjunto com o Garage Band - programa que emula recursos de gravação e mixagem de um estúdio - Otto consegue realizar um trabalho autoral de qualidade e intenso. Na capa, o cantor parece fazer uma relação do mangue com os possíveis sonhos intranquilos. O título é uma transcrição da frase que abre o texto “A Metamorfose”, do escritor de ficção Franz Kafka (1883-1924): “Quando certa manhã Gregor acordou de sonhos intranqüilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso”. Resta saber em que momento e qual foi a experiência que Otto passou para se identificar com esse verso tão profundo.

3 comentários:

Glauber disse...

eeei! essa crítica é sensacional!! muito melhor do aquela do livro do Carlos Heitor Cony! captou mto bem a essencia do disco, tanto no que há de bom quanto no que há de ruim! tô todo orgulhoso de você!! =**

à parte o excelente texto, me senti particularmente tocado pelo epílogo, quando vc diz "(...) e pessoas não pertubam o meu juízo." hehehehehe

bjos!!

Andreane disse...

Foi pra vc mesmo essa frase =P

hahahahaha

Glauber Lemos disse...

quer dizer, então, que perturbo teu juízo?

¬¬